Em nosso estado estamos completando quase 5 meses de aulas presenciais suspensas. Até que nossas crianças retornem fisicamente às escolas, muitas perderão os benefícios educacionais, sociais e de desenvolvimento essenciais. Profundas injustiças raciais e socioeconômicas serão ainda mais exacerbadas. Temos que lembrar que a escola serve como ambiente sadio a nossas crianças, evitando exposição a drogas, violência, instabilidade familiar, entre outros. Muitos alunos dependem da refeição na escola como parte nutricional essencial do seu dia. Outros com deficiências diversas, necessitam do estímulo escolar para manter desenvolvimento adequado, evitando diversas complicações.
Devido a isto, acredito que a reabertura segura das escolas de ensino fundamental deve ser uma prioridade nacional. Agora quando fazer, e como, são as perguntas mais importantes. Algumas experiências internacionais, como na Holanda, mostraram que mesmo retornando as aulas logo após o pico da doença, não foi visto aumento na transmissão, mesmo sem qualquer distanciamento nas crianças até 12 anos. Outros estudos sugerem que as aulas sejam retomadas a partir de condição de transmissão moderada (menos de 10 novos casos diários para cada 100.000 pessoas).
Do ponto de vista clínico, a maioria das crianças de 1 a 18 anos apresenta no máximo uma doença leve por Covid-19 e tem uma probabilidade menor do que adultos de enfrentar consequências graves da infecção. Embora um pequeno número de crianças em todo o mundo tenha sido hospitalizado com síndrome inflamatória multissistêmica, até agora esta parece ser uma síndrome rara (1-2 casos a cada 100.000 pessoas), e com diagnóstico e tratamento adequados, os resultados clínicos têm sido ótimos. Em contraste, os adultos, especialmente aqueles com mais de 60 anos ou com comorbidades, correm maior risco de hospitalização e resultados ruins.
Evidências também sugerem que a chance de pegar à infecção aumenta com a idade. Dada a mesma exposição a familiares infectados, crianças com menos de 10 anos parecem ser infectadas com menos frequência do que adultos e adolescentes mais velhos. Na outra extremidade, idosos têm maior risco à infecção, mesmo comparando a adultos de meia idade. As diferenças quanto a infectividade relacionadas à idade são menos claras. Os resultados de alguns estudos sugerem que as crianças podem ser menos infecciosas do que os adultos, mas essa evidência ainda é limitada. Um estudo recente da Coreia do Sul de contatos domiciliares sugere que crianças infectadas com menos de 10 anos de idade são menos contagiosas do que adultos e adolescentes infectados.
Na França, Israel e Nova Zelândia vimos alguns surtos em áreas específicas após reabertura de universidades e escolas de ensino médio, mas não isso não se estendeu até as escolas primárias. Dinamarca, Finlândia, Bélgica, Áustria e Taiwan não viram aumento nos casos após reabertura das escolas. Apesar de não haver restrição em grande parte destes países durante as aulas, alguns cuidados são tomados e que poderíamos adaptar a nossa realidade.
A sugestão que fica então é iniciar a retomada com os alunos menores (até o ensino fundamental), e progredir até o ensino médio conforme diminuição da transmissão comunitária. Os pais não podem ter nenhum contato com funcionários da escola (afinal os pais são os maiores transmissores), orientando a entrada de seus filhos até a escola de uma distância segura. As salas de aula devem conter apenas 50% de sua capacidade (podendo ser revezado os dias de aulas de cada grupo), mantendo um ensino misto, além de disponibilizar opção de manter aulas a distância para os alunos com fatores de risco ou para os pais que não se sentem seguros.
Reabrir (e como) as escolas primárias não é apenas uma questão científica e tecnocrática. É também emocional e moral. A sociedade tem que se unir ao estado para buscar a melhor solução para nossas crianças.